Não pretendo discutir aqui se deve ser "sim" ou "não". Advogadim de província, tenho "cá consigo" (no dizer de um passaquatrense) que quem sabe direito é juiz. Posso pensar o que quiser, posso argumentar o quanto possa, mas quem dá a sentença é o juiz. E vale a sentença, que nem no jogo do bicho, em que "vale o escrito". E mais: como posso ter certeza sobre qualquer questão de direito se os onze magistrados da Excelsa Corte não chegam a um acordo? Discussão inútil, pois.
As questões que abordo são duas: a primeira refere-se aos aspectos da segurança jurídica. Em 2016, cinco ministros votaram em um sentido, seis em outro. Isto, por si só, já enche de dúvidas o cidadão. A segunda é "mais pior" (Latricério, personagem de Stanislaw Ponte Preta - Sérgio Porto): como é possível, em dois anos de vida daquela decisão, sem que tivesse havido modificação em qualquer norma, que algum(uns) dos Ministros que votaram possa(m) mudar de ideia? Qual a segurança do cidadão? Pensará estar sujeito ao sabor do vento? E, na sua santa ignorância jurídica - perfeitamente cabível - poderá pensar o que quiser, em face das incertezas de juristas do mais alto jaez, de ilibada conduta e notório saber jurídico.
Não é para entrar na onda do povo (mesmo porque vi ninguém do povo, de qualquer crença política, religiosa ou filosófica - vi ninguém, repito - assomar à imprensa ou à tribuna para opor-se ao encarceramento de quantos - e são muitos, de colarinho branco - com canetas - e de colarinho sujo - com armas de fogo - tiveram as ordens de prisão sustentadas pela decisão de 2016), mas vou analisar aqui o voto do Ministro Gilmar Mendes, em 2016, seja por sua segurança ao proferir aquele voto, seja porque ouvi outras pérolas, uma contemporânea, outra atual do mesmo Ministro. Transcrevo o que li em G1 (http://g1.globo.com/politica/noticia/2016/10/supremo-mantem-prisao-apos-condenacao-em-segunda-instancia.html):
"Presidente, a mim me parece que aqui encerrando, não há nenhuma dúvida de que a realidade mostra que nós precisamos, sim, levar em conta não só o aspecto normativo que, a meu ver, legitima a compreensão da presunção de inocência nos limites aqui estabelecidos a partir do voto do Relator, como também - e aqui estou acompanhado - como também levar em conta a própria realidade que permite que exigir o trânsito em julgado formal transforme o sistema num sistema de impunidade. Portanto, Presidente, com todas as vênias ao voto do Ministro Marco Aurélio, do Ministro Lewandowsky, da Ministra Rosa, eu acompanho na íntegra o pronunciamento do Ministro Fachin, destacando que talvez, se formada a maioria, nós devêssemos, na linha do que já fizemos em outro momento, também converter este julgamento em julgamento de mérito, até porque senão vamos ter um outro debate sobre a eficácia deste julgamento, uma vez que estaremos apenas indeferindo a liminar. A mim me parece que coloco esta questão como uma questão de ordem para que possamos definir a mim me parece que se estamos até tarde hoje é em razão de termos uma definição e é importante então que esta decisão tenha eficácia geral, efeito vinculante. Com as vênias devidas ao eminente Relator, acompanho às inteiras o voto do Ministro Fachin.".
Naquela oportunidade, outra parte da fala do Ministro Gilmar foi reproduzida em G1 (link):
"Em seu voto, também pela prisão depois da condenação em segunda instância, Gilmar Mendes argumentou que as etapas do processo penal indicam uma gradação que permite formar convicção sobre a culpa do suspeito, após a condenação.
'Uma coisa é termos alguém como investigado. Outra coisa é termos alguém com condenação. E agora com condenação em segundo grau. O sistema estabelece uma progressiva derruição da ideia de presunção de inocência', defendeu Gilmar Mendes.".
Fui colher também um pronunciamento recente do Ministro Gilmar, em Portugal (visto e ouvido pela TV, ontem, e lido agora, em O GLOBO (https://oglobo.globo.com/brasil/gilmar-ter-um-ex-presidente-condenado-muito-ruim-para-imagem-do-brasil-22550215):
"- O Supremo tem que se preocupar com o didatismo, mas não sei se terá êxito. O Supremo tem que explicar a decisão e como ela se aplica. Nesta questão da segunda instância, por exemplo, o meu entendimento, e eu acompanhei a maioria formada então, é que nós estávamos dando uma autorização para que, a partir do segundo julgamento, pudesse haver a prisão. Era um termo de possibilidade que na prática virou ordem de prisão. Para mim, é uma grande confusão e temos que esclarecer nesta decisão. Se o juiz, a partir da segunda instância, pode prender, ele tem que fundamentar, dar causa. Se há automaticidade, nós já temos outro quadro. Há uma grande confusão e é importante o tribunal esclarecer - declarou."
Na minha santa ignorância, Ministro Gilmar, penso que é Vossa Excelência - e não qualquer tribunal - quem tem de esclarecer essa confusão que pessoal e explicitamente deitou sobre o assunto.
Data venia, senhor Gilmar, não me venha com seus borzeguins ao leito!
Imagem: PONTO DE VISTA COM NELSON FREIRE
https://www.pontodevistaonline.com.br/principio-de-incendio-atinge-anexo-stf/
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