27 de dez. de 2019

O PROBLEMA É QUE EU SOU MINEIRO

No final da semana passada, assisti a uma entrevista extremamente interessante para mim, concedida pelo Ministro da Economia aos vários jornalistas da Globo News.
Quase sem perceber, acabei lembrando-me de escritos meus, de 1987, sobre entrevista concedida pelo Ministro da Indústria e Comércio de então.
O ministro Paulo Guedes ocupou quase todo o tempo falando, provavelmente estratégia para ser menos inquirido. Quando alguém falava em que se deveria fazer certa coisa, respondia, rapidinho: "mas já estamos fazendo" e emendava várias explicações. A ponto de FHC "elogiá-lo", como está na revista Fórum,  (https://revistaforum.com.br/politica/fhc-elogia-entrevista-de-paulo-guedes-deixou-jornalistas-treinados-de-escanteio/), com evidente ironia, como se pode ver no recorte do Twitter, colhido na página acima.


Não gostei das vezes em que interrompeu perguntadores e, em dois momentos, de modo que me levou a duvidar. Falando sobre países que estão com economias mais desenvolvidas que a nossa, referiu-se, dentre outros, à China. Cristiana Lôbo ensaiou perguntar, a oportunidade não apareceu logo. Quando foi possível, argumentou: "Mas ministro! A China treina seus jovens." O ministro devolveu de sem-pulo: ah! a China é uma ditadura! Não vamos falar da China! Vamos falar da Alemanha!
Ora, gente! Mas ele é que havia citado a China. Fiquei por entender. Em outro momento, quando um jornalista comentou sobre a economia do Chile, que passa por momentos difíceis, envolvendo situações de aposentadorias, respondeu que alguns economistas estiveram naquele país (ele, inclusive, embora não se tenha referido a isto na entrevista) e fizeram reformas com resultados bons, mas políticos locais, posteriormente, cometeram erros e atrapalharam. Acrescentou que o problema é que os salários, no Chile, são bem mais altos do que em Cuba, onde os aposentados recebem 100% (não entendi de que, mas é uma referência) e, no Chile, recebem 70%. Mas os 70% do Chile correspondem, em valores numéricos, a mais do que os recebidos em Cuba. Não me agradou a comparação do ministro. Pareceu-me fora de propósito comparar o Chile com Cuba.
Mas o que é que o ministro da Indústria e Comércio de 1987 tem a ver com este papo?
Em 1987, comentei, no jornal "Estado de Minas" - Sucursal de Uberlândia, que a toda hora aparecia alguém do governo para dar explicações. Não era raro obrarem em contradições. Vou transcrever um excerto:
"É! Mas, no último domingo, um Ministro - o da Indústria e Comércio - veio superar tudo o que de belo se tem falado por aí, em termos de explicações. Pintou um Brasil com céu de Brigadeiro, mar de Almirante e planícies para General de Infantaria nenhum botar defeito! Nada de pessimismo! Está tudo muito bem! O povo tem mais é que acrediar nas suas próprias potencialidades e na sua capacidade inesgotável de explorar mais e melhor os recursos disponíveis neste país, onde Cabral tropeçou um dia. Nada de pessimismo, pessoal, que a maré está pra peixe! Foi muito agradável vê-lo e ouví-lo. Boa pinta, simpático e bem falante, sorriso de dente do ciso, otimista que nem técnico de time pequeno, quando enfrenta os grandes. Inteligente e hábil para discutir. Ótimo na esgrima do diálogo. Safa-se das mais perigosas estocadas dos jornalistas, como os mocinhos da TV se desviam dos tiros dos bandidões. Não permitiu, em momento algum, que o pessimismo dos jornalistas lançasse sequer uma nuvenzinha cinzenta no horizonte do imenso azul que é o nosso verdadeiro céu. Mas houve um momento em que eu temi pelo brilho do discurso do senhor Ministro. Foi quando um jornalista perguntou da sorte da pequena e média empresa, na conjuntura dos juros de trinta por cento. Estão sem condições de operar e é muito provável que entrem em colapso, o que irá atingir faixa ponderável dos componentes da economia nacional. Aí foi que eu vi que o homem é bom mesmo! Não deixou por menos. Disse, enfaticamente, que as pequenas e médias empresas terão, em 87, o seu ano de ouro, porque disto está cuidando o Ministério da Indústria e Comércio. E afirmou:
- Vocês precisam ver os programas extraordinários que estamos fazendo no Ministério.
Não deu muito certo, como se viu.
Sei que a situação atual não é idêntica.
Mas incomoda-me a euforia governamental.
Dizem que sou pessimista... montão de coisas.
Acho que o problema é que eu sou mineiro: mais desconfiado do que burro de olaria!

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