Foi minha filha Fifi quem me ligou, para dizer que o Morengueira estava lá. Por que é que a gente não transita pelos canais que tratam de cultura, indiscriminadamente? Preguiça? Desinteresse? Ou falta de oportunidade de adquirir o hábito?
No meu caso, era ignorância, mesmo. A TV Brasil não fazia parte do meu pacote. Entrou nele de alegre. Não tenho rodado por ela. Passo pela TV Cultura, pela TV Senado, TV Câmara e mesmo pela Globo News, emissoras que apresentam programas sobre a nossa cultura, em geral (a Globo News em freqüência menor, porque, conforme o nome, o negócio dela é outro).
É claro que fui ao encontro do Morengueira. Programa ótimo, o cantor apresentando-se com uma roda de músicos jovens. O encontro de gerações é possível, sim. Importante, também, é não se fixar naqueles jargões, como "O Último dos Malandros", como se Moreira da Silva fosse praticante daquilo que cantava. Ou até podia ser, mas só se encarando o samba "Dormi no Molhado". Na verdade, Morengueira trabalhou duro, como motorista de ambulância, além de outras atividades. E deixou uma obra muito boa e muito volumosa. Malandro não é vadio, nem desonesto. Malando é malandro.
Continuo insistindo: os governos, federal e estaduais principalmente, devem ser os agentes principais da preservação da nossa cultura. Não estou pensando só em Morengueira, em Adoniran Barbosa, em Ademilde Fonseca, não. Já assisti a apresentações de Marcelo D 2, em uma dessas emissoras. Apresentam Hip Hop, Rap, etc., com muita propriedade.
Seria bom que o governo oferecesse canais abertos, para que todas as pessoas pudessem assistir a esses tipos de manifestações. É claro que, no início, apenas uma minoria conhecedora desses gêneros iria assistir. Mas já é uma forma de atender aos interesses das minorias. O boca-a-boca e mesmo a divulgação, em emissoras mais freqüentadas, acabariam por engrossar o bloco dos afeiçoados.
DORMI NO MOLHADO - MOREIRA DA SILVA
Eu quando vejo um rapaz da sua idade estendendo a mão
Dele não tenho
compaixão
Porque não me conformo,
Ver um homem de talento não querer
trabalhar
Sempre no me-dá-me-dá
Eu também já passei fome
Já sofri e não morri
Estou aqui vivo e
são
E ninguém vai dizer que não
Eu já andei atrapalhado
Já andei afanado
Mas nunca pedi tostão
Acho
que estou com a razão
Eu enfrentei uma marreta na pedreira São Diogo
Quebrando pedra
roliça
Passando a pão e a lingüiça
Dormindo no cais do porto
No meio da
sacaria,
Onde os ratos dormiam,
Onde ventava e chovia
Quando o dia amanhecia
Vinha o chefe da limpeza
Jogando água
fria
Vejam só como eu saia,
Sem café e sem cigarro
Sem saber pra onde
ia
Sem tostão e sem vintém
Mas nunca pedi a ninguém
Cortei asfalto na
linha
Fui vendedor de
galinha
Carreguei cesto
na feira
Eu fui garçom
de gafieira
Comia numa
tendinha
Que só fritavam
sardinha com azeite de lamparina
Eu só cheirava a gasolina
Fui peixeiro, carvoeiro, quitandeiro
Fui bicheiro, apanhei como um
ladrão
Mas não mudei de opinião
E como sou caprichoso,
Hoje me sinto
outro homem
Até já mudei meu nome
Já me disseram até que eu virava lobisomem
Foto: Quem Disse.
http://www.quemdisse.com.br/especial.asp?QDCOD=GP892XQHAP6X0SHIUGVH
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