Cassado Demóstenes Torres, podemos descansar. Será?
Os parlamentares preferiram o voto secreto. Por que têm medo de manifestar o que pensam?
Diz a Constituição Federal, em seu artigo 5º, que
"IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato;".
Se é aplicável, ou não, quem sou eu para discutir. O voto é obrigatório e também livre. Não me digam que não é manifestação do pensamento (porque já penso que, muitas vezes, os votos dos parlamentares não são manifestação do pensamento; mas isto não lhes cai bem).
Fui buscar algumas informações (a memória não é tão boa assim, uai). Os termos do julgamento do Mandado de Segurança impetrado por Fernando Collor, referente ao julgamento do processo de seu impeachment, estão em http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/sobreStfConhecaStfJulgamentoHistorico/anexo/MS21564.pdf.
Uma das pretensões ex-Presidente era que os votos dos congressistas fossem secretos.
Exceto um, todos os Ministros do Supremo Federal negaram provimento a esse pedido. Lembro-me de que escrevi sobre isto, antes do julgamento e mandei para o jornal que publicava bobagens que eu escrevia. O jornal poderia ter antecipado o voto quase unânime do Supremo Tribunal Federal. Mas o editor chefe deve ter pensado: "quem esse ratapulgo pensa que é? Metido a jurista? Eu, hein? Dá diferente e o jornal cai no ridículo!". Quase empatei com o Supremo e o jornal, por não querer correr o risco, perdeu aquilo que achei, na minha imodéstia, que era uma oportunidade.
Memória fraca, colhi algumas manifestações de Ministros, e algumas citações deles.
Do Ministro Octavio Galloti (Relator): "Razão da publicidade — O sigilo nas
votações, se, por um lado, atende à liberdade de não-emitir o pensamento, a despeito
da 'emissão para efeito de contagem', por outro lado evita que temperamentos
menos corajosos se abstenham de votar, ou temperamentos exibicionistas tomem
atitudes escandalosas ou insinceras. § Em torno do mesmo dispositivo, ponderou Carlos Maximiliano: Em um regime democrático devem os governos agir à luz
meridiana, expondo todos os seus atos ao estudo e à crítica dos interessados e dos competentes. A publicidade ainda é mais necessária, em se tratando das
palavras e votos de congressistas, que não têm senão a responsabilidade moral e são mandatários diretos do povo."
O Ministro Carlos Velloso: "Registre-se, ademais, em favor da recepção e aplicabilidade
do citado art. 23, no caso, que o voto ostensivo é o voto responsável, é o voto querido pela Constituição. O voto
secreto é exceção ao princípio da publicidade. Bem por isso, a começar pelo Poder Judiciário, a
Constituição deixou expresso que todos os julgamentos 'serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade,... ' ... No que toca à Administração Pública, a Constituição não se
importou em incorrer em demasia, ao determinar, no art. 37, que ela, Administração Pública, 'obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade',...".
O Ministro Paulo Brossard: Convém, aqui, relembrar distinção singela, mas que vem sendo convenientemente esquecida por alguns: o princípio do voto secreto aplica-se ao representado, isto é, ao eleitor que escolhe o seu representante junto ao Parlamento: a este representante, até pelo dever moral que tem ele de prestar contas de suas ações aos representados, aplica-se a regra geral do voto ostensivo e nominal - para que o povo possa saber com exatidão qual é o sentido da atuação do parlamentar - exceto nos casos, repita-se, em que o constituinte julgou conveniente excepcionar a regra geral.
E vai por aí. Isto ocorreu há vinte anos atrás.
Ousei discordar (como costumam dizer os Desembargadores e Ministros) das opiniões, no STF, de que os parlamentares têm obrigação moral de prestar contas. Havia tratado disto em meu estudo rejeitado pelo jornal. Vigorava o Código Civil de 1916, estabelecendo que "O mandatário é obrigado a dar contas de sua gerência ao mandante, transferindo-lhe as vantagens provenientes do mandato, por qualquer título que seja". Pensava - e penso - que se aplicava ao caso Collor. O Código Civil de 2002, em vigor, manteve a redação. Penso que se aplica ao caso Demóstenes.
Logo, penso que a obrigação de prestar contas não é apenas moral. É legal.
A unica forma de um senador prestar contas de seu mandato é votar explícito. Não adianta vir me dizer, depois, que votou assim ou assado. Só acredito vendo!
O cidadão fica sem saber em que votou - através de representante - porque este, votando atrás da moita, escamoteia a informação. Afinal, foi o cidadão quem votou e não o representante, como se poderá pensar.
No frigir dos ovos, o cidadão fica sabendo de nada. Do mesmo jeito que muitos agentes públicos. O primeiro, por ignorância, porque lhe sonegaram informação, os outros, por conveniência.
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