Lembro-me de que meu professor de geografia, Betâmio Paraíso, no Colégio Estadual de Belo Horizonte, 1957, dizia-nos com a seriedade com que sempre se apresentava:
"Tenha um filho. Feche esse filho em um quarto, comunicando-se apenas com você. Mostre-lhe a imagem de um avião e diga-lhe: 'isto é uma xícara'; mostre-lhe a imagem de um automóvel e diga-lhe: 'isto é uma vassoura'; mostre-lhe uma cadeira e diga-lhe: 'isto é um orangotango'; mostre-lhe a imagem de um orangotango e diga-lhe: 'isto é a imagem de um homem'. Em pouco tempo, terá criado um monstro".
É assim que sinto o ufanismo a respeito da seleção brasileira: digam à torcida que somos os melhores do mundo; digam à torcida que nossos craques são muito mais craques do que os das outras seleções - do que o Messi, inclusive - digam à torcida que, no Brasil, não há como nem por que perder; digam-lhe... e terão criado um monstro: uma torcida presa de uma paixão desenfreada pela seleção, desvairada, pronta para agredir tudo e todos, diante de um fracasso.
Obviamente, não gostei de saber que o Felipão declarou que temos obrigação de ganhar a copa. Acrescentou que não somos favoritos, agora, mas teremos de fazer o possível para chegar a esse favoritismo. Já é menos mau. No programa Arena, pelo Sportv, só vi comentário de que teria dito que temos obrigação de ganhar, sem qualquer observação paralela.
Aí mora o perigo: o cara diz uma coisa e os comentaristas tomam da conversa apenas o que lhes interessa, como, por exemplo, conforme o Caio, "estádios cheios".
Diante da abordagem do tema "temos obrigação de vencer", isolado do contexto da entrevista, só um comentarista - Oscar, se não me engano - foi ponderado: disse que a França tem obrigação de vencer, a Itália tem obrigação de vencer, a Inglaterra tem obrigação de vencer... e assim por diante. Ponderou que não é lógico pensar que o vice-campeão será apenas o melhor dos últimos. De fato, se é certo que haverá uma final, teremos de presumir que terão chegado lá dois sérios candidatos ao título, cada um com a obrigação de vencer. O contrário, ou seja, o Brasil finalista e, do outro lado, um time de cabeças de bagre, a conclusão terá de ser no sentido de que foi muito fácil chegar à final e que a conquista do título será uma simples questão de noventa minutos. Detalhes, como gosta o Parreira.
Não fica bem a quem pretenda ser campeão. Lembro Don Rodrigo de Bivar - Cid, o Campeador - desafiando o sogro para um duelo a espada, e o desafiado advertindo: "sou a melhor espada do reino, você certamente sucumbirá". Ao que El Cid retrucou: "Vencer sem perigo é triunfar sem glória".
Certamente, não é o que pretendemos para a nossa seleção. O título diante de um grupo de pernas de pau. Ou, eventualmente, uma derrota horrível, para um time de pernas de pau (se interessar, vejam ANÃO X GIGANTE - BRIGA RUIM, em http://cadikimdicadacoisa.blogspot.com.br/2012/03/anao-x-gigante-briga-ruim.html.
Mesmo com a ressalva de Felipão, de que não somos os favoritos, agora, desagradou-me o "temos obrigação de vencer".
Não é lógico pensar nisto, agora. Se Mano Menezes foi dispensado, não poderá ter sido porque ele - apenas ele - estava indo mal, e a seleção estava indo bem. Penso que teria sido impossível a seleção ter estado bem, apesar de um mau comando - assim considerado por quem o dispensou, certamente.
Acho que a seleção brasileira está sendo conduzida com a mesma paixão que dominou a CBF - e a mídia - após a perda da copa de 2010: tinha de mudar tudo, renovar todos...
Estamos enfrentando uma das consequências daquilo que sempre considerei uma insanidade.
Pretendo falar sobre a substituição de Mano Menezes e as circunstâncias. Tenho um texto preparado mas pretendo amadurecê-lo. Não quero ser o desmancha-prazeres.
Foto: R7 Esportes.
http://esportes.r7.com/futebol/noticias/em-retorno-a-selecao-felipao-diz-que-titulo-de-2014-e-obrigacao-20121129.html?question=0
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